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segunda-feira, outubro 6, 2025

Crédito consignado CLT avança, mas expõe fragilidades: uso impulsivo, desinformação e risco estrutural

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Prometido como alternativa acessível, modalidade movimenta R$ 14 bilhões, mas revela lacunas críticas de orientação e educação financeira entre trabalhadores formais

Lançado como uma linha de crédito simplificada e com juros atrativos para trabalhadores com carteira assinada, o consignado CLT já movimentou mais de R$ 14 bilhões desde sua implementação. No entanto, uma nova pesquisa da Abefin (Associação Brasileira de Profissionais de Educação Financeira) em parceria com o Instituto Axxus revela um cenário que exige atenção: a modalidade vem sendo utilizada com pouco planejamento, motivada por urgência e carência de orientação.

Por que os brasileiros estão contratando o consignado CLT?

A pesquisa ouviu 800 pessoas — metade contratantes, metade simuladores — e revelou que:

  • 36% contrataram o crédito para quitar dívidas mais caras, como rotativo do cartão de crédito;
  • 29% recorreram ao empréstimo para despesas médicas;
  • 26% usaram o recurso em reformas residenciais.

A Abefin destaca que, em vez de promover reorganização financeira, o crédito tem servido como solução paliativa, trocando dívidas mais severas por outras de prazo mais longo, mas ainda onerosas.

Juros mais baixos? Nem sempre

Apesar da promessa de juros reduzidos, a taxa pode chegar a 7% ao mês — um percentual elevado se comparado ao CDC ou ao crédito automotivo. Muitos contratantes sequer tinham conhecimento dessa realidade:

  • 83% não sabiam quanto pagariam de juros;
  • 69% não calcularam o impacto das parcelas no orçamento mensal.

Ainda assim, 87% disseram não se arrepender da contratação — um número que, segundo o estudo, revela mais desconhecimento do que satisfação real.

Crédito por impulso e sem comparação

Outro dado preocupante é que 19% dos entrevistados utilizaram o crédito para compras de bens de consumo, como eletrodomésticos e veículos. Essas decisões, em geral, foram feitas sem comparação de taxas, sem considerar alternativas de financiamento e, principalmente, sem planejamento prévio.

Falta de orientação agrava o problema

A pesquisa mostra que mais da metade dos tomadores (54%) não recebeu nenhum tipo de orientação antes de contratar o crédito. Entre os que buscaram informações:

  • 24% recorreram à internet;
  • 9% se aconselharam com amigos;
  • Apenas 5% obtiveram dados nos canais oficiais da instituição financeira.

A estrutura transfere ao trabalhador toda a responsabilidade da decisão, mesmo diante de um cenário de assimetria informacional clara”, observa o relatório da Abefin.

O papel do FGTS como garantia: sinal de alerta

A crescente utilização do FGTS como colateral também preocupa especialistas.

  • 89% dos entrevistados sabiam que o fundo seria vinculado ao contrato, mas ainda assim avançaram com a contratação.

Para a Abefin, trata-se de um uso banalizado de uma reserva crítica. O FGTS, originalmente voltado a momentos de vulnerabilidade como demissão ou aposentadoria, está sendo consumido em trocas por liquidez imediata — muitas vezes mal direcionada.

Os indecisos: bomba-relógio silenciosa

Mesmo entre os que apenas simularam o crédito e não o contrataram, o desconhecimento prevalece:

  • 67% não avaliaram o impacto das parcelas no orçamento;
  • 53% desconheciam os juros máximos aplicáveis.

Entre os motivos para simular o crédito, destacam-se:

  • Avaliar a viabilidade do empréstimo (42%);
  • Necessidade urgente de recursos (29%);
  • Facilidade de acesso (25%);
  • Substituição de dívidas mais caras (19%).

No entanto, apenas 4% pretendem buscar orientação financeira profissional no futuro. A Abefin classifica esse grupo como vulnerável: “Não contratar, nesse contexto, não significa prudência, mas indecisão motivada por desinformação”.

Modelo falho exige resposta institucional

O estudo conclui que o consignado CLT, embora legítimo em determinadas situações, está sendo ofertado em um modelo que não garante proteção ao consumidor. A combinação entre urgência financeira, ausência de transparência e falta de suporte educativo transforma a solução em um potencial risco sistêmico.

Entre as recomendações propostas pela Abefin estão:

  • Criação de campanhas obrigatórias de educação financeira;
  • Simulações claras com detalhamento do Custo Efetivo Total (CET) e comparação com outras linhas;
  • Implementação de uma plataforma pública de comparação de taxas, nos moldes de simuladores habitacionais;
  • Fortalecimento da fiscalização das práticas de oferta e comunicação das instituições financeiras.

Conclusão

A expansão do crédito consignado CLT revela uma realidade ambígua: ao mesmo tempo em que oferece acesso rápido a recursos, expõe trabalhadores formais a decisões financeiras mal informadas, com consequências de longo prazo.

Sem ajustes estruturais, o que deveria ser uma ferramenta de apoio pode se transformar em mais um catalisador do endividamento crônico no Brasil.

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