Enquanto o Brasil ainda ensaia os primeiros movimentos estratégicos com UGC, o formato passa por uma sofisticada reinvenção nos mercados mais maduros.
O conteúdo gerado por usuários — conhecido pela sigla UGC (User Generated Content) — consolidou-se, nos últimos anos, como um ativo valioso dentro das estratégias digitais. Ao combinar elementos de prova social, baixo custo de produção e agilidade na geração de peças criativas, o formato ganhou protagonismo nas campanhas orientadas à performance.

No entanto, à medida que as marcas passaram a replicar esse modelo em larga escala, a autenticidade — justamente o principal atributo do UGC — começou a se diluir. O que surgiu como uma forma genuína de conexão com o consumidor passou a seguir roteiros engessados, com produções cada vez mais previsíveis.
Um novo ciclo de reinvenção

A Thruster Creative Strategy, agência especializada na implementação de sistemas criativos voltados à performance, tem acompanhado essa transformação de perto desde 2022. Com base em sua atuação junto a marcas internacionais, a empresa mapeou cinco caminhos que têm orientado a reinvenção do UGC e permitido às marcas restabelecer vínculos mais autênticos com seu público. A seguir, os principais insights:
1. Conteúdo reacional e espontâneo
A nova geração de UGC afasta-se de roteiros rígidos e prioriza reações genuínas, situações cotidianas e linguagem natural. Com baixa edição e câmeras posicionadas de forma discreta, esses conteúdos remetem à espontaneidade que originalmente conferiu ao UGC seu apelo único.
O esgotamento dos formatos excessivamente roteirizados — como os vídeos de “fake podcast” ou “entrevistas de rua”, que dominaram o cenário entre 2021 e 2023 — impulsionou esse retorno à autenticidade. O que volta a funcionar são inserções sutis de produto em contextos plausíveis, com falas que soam verdadeiras.
2. UGC como extensão do time criativo
Mais do que peças isoladas, o UGC vem sendo incorporado como parte integrante das estruturas de mídia das empresas. Marcas globais têm estruturado times dedicados de criadores para alimentar ecossistemas com alto volume de conteúdos reutilizáveis — como b-rolls, depoimentos, criativos para testes A/B e até variações geradas por inteligência artificial.
Esse modelo também permite a localização de campanhas internacionais a partir de ativos previamente validados, com adaptações pontuais de linguagem e contexto.
3. Co-criação e segmentação de talentos
Nem todo criador precisa ter grande audiência. Muitos dos talentos mais valiosos para esse novo UGC são consumidores que conhecem profundamente o produto e cocriam com as marcas de forma precisa e estratégica. Outros operam com base em briefings prontos, ideais para testar variações em escala.
“Hoje nosso relacionamento com os creators é segmentado conforme o nível de envolvimento”, explica Danilo Nunes, especialista em estratégia criativa. “Temos desde aqueles que cocriam por já serem usuários e conhecerem bem a marca, até os que apenas executam com um toque criativo conteúdos pré-roteirizados. Há ainda quem produza b-rolls ou vídeos básicos para diferentes aplicações — esse perfil vem sendo chamado de CGC, ou Creator Generated Content, pois o conteúdo, embora pareça espontâneo, já é comissionado.”
O avanço desse modelo tem levado marcas a criarem hubs internos de criadores, com metodologias próprias de gestão e contratos contínuos para abastecer campanhas sempre ativas (always-on), bem como ações sazonais.
4. Profissionalização e inteligência criativa
Embora o UGC se diferencie do marketing de influência tradicional, o perfil do criador de conteúdo tem se aproximado cada vez mais do de um estrategista criativo. Muitos já atuam com entregas completas — desde roteirização e storytelling até análise de desempenho e aplicação de inteligência artificial para personalização de peças.
“Nos Estados Unidos, muitos UGC creators que entenderam a dinâmica do mercado passaram a oferecer não apenas execução, mas também estratégia e gestão de produção”, observa Danilo. Esse movimento elevou o valor agregado do UGC e consolidou a função como uma categoria profissional emergente, com entregas cada vez mais sofisticadas.
5. Formação especializada e maturidade de mercado
O amadurecimento do UGC como disciplina estratégica tem impulsionado a criação de programas de capacitação voltados à nova realidade do mercado. Um exemplo é o curso “UGC Creators e Formato UGC para Campanhas de Mídia Online”, que será lançado pela ESPM em agosto.
Com foco em briefing, gestão de criativos e análise de performance, o curso será ministrado por Danilo Nunes e Malu Celestino — ambos com trajetória reconhecida em estratégias de conteúdo e ativação de campanhas para marcas globais, especialmente em plataformas como a TikTok Shop. A proposta é formar profissionais aptos a integrar o UGC de forma orgânica às estruturas de marketing digital das empresas.
Conclusão: autenticidade em equilíbrio com escala
À medida que o UGC evolui de um formato espontâneo para uma ferramenta estratégica altamente profissionalizada, marcas e profissionais se deparam com o desafio de equilibrar autenticidade e escalabilidade. O conteúdo gerado por usuários segue sendo uma peça-chave na construção de relevância digital — mas exige agora inteligência criativa, gestão precisa e um olhar atento àquilo que realmente conecta.