Apesar da força dos títulos públicos, o mercado imobiliário preserva seu espaço em carteiras diversificadas — sobretudo com foco no longo prazo
Com a Selic em níveis elevados, os títulos do Tesouro Direto voltaram a figurar entre as aplicações mais rentáveis e seguras do mercado. Há papéis que remuneram IPCA + 7% ao ano até 2035 — uma taxa real significativa. Ainda assim, o investidor com horizonte de longo prazo não deve desconsiderar o potencial estratégico do setor imobiliário na composição de sua carteira.
Além da diversificação — princípio basilar de uma alocação robusta —, os ativos imobiliários oferecem dinâmicas distintas de geração de valor, especialmente quando mantidos por prazos mais dilatados. Segundo especialistas ouvidos pelo InvestNews, o ideal é permanecer posicionado por, no mínimo, cinco anos — sendo recomendável um horizonte de dez anos ou mais.
Por que considerar o setor imobiliário com juros altos?
Em um cenário de renda fixa generosa, a tentação de abandonar os investimentos mais voláteis é compreensível. No entanto, há espaço para complementaridade: analistas sugerem que até 30% do capital destinado a investimentos pode ser alocado em produtos ligados ao mercado imobiliário — desde que não haja expectativa de resgate no curto prazo.
O desafio, portanto, está em escolher o instrumento mais aderente ao seu perfil. Abaixo, um panorama dos principais veículos de acesso ao setor:
PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE INVESTIMENTO IMOBILIARIO
LCI (Letra de Crédito Imobiliário)
- Emitida por bancos
- Isenção de IR para pessoas físicas
- Garantia do FGC até R$ 250 mil
LIG (Letra Imobiliária Garantida)
- Benefícios semelhantes à LCI
- Adicional de dupla garantia: da instituição emissora e de uma carteira separada de ativos
CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários)
- Emitido por securitizadoras
- Maior risco, porém maior retorno
- Isento de IR, sem cobertura do FGC
FII (Fundo de Investimento Imobiliário)
- Negociado em bolsa
- Investe em imóveis físicos ou títulos do setor
- Distribuição mensal de dividendos isentos de IR
- Exposto à volatilidade
Imóvel físico para locação
- Geração de renda recorrente com reajuste por IPCA ou IGP-M
- Elevado capital inicial e necessidade de gestão ativa
Fundos imobiliários: como se comportam em ciclos de juros altos?
Os FIIs seguem sendo um ponto de entrada acessível e versátil. Com cotas a partir de R$ 100 e isenção de IR sobre dividendos, atraem diferentes perfis. O investidor, contudo, deve compreender as categorias e a dinâmica de remuneração de cada tipo de fundo.
O mercado conta com mais de 400 FIIs listados na B3, agrupados em três grandes segmentos:
- Fundos de papel — investem em CRIs, LCIs e LIGs
- Fundos de tijolo — detêm imóveis físicos para locação
- Fundos de fundos (FoFs) — aplicam em cotas de outros FIIs
No atual contexto, os fundos de papel tendem a apresentar desempenho superior, pois estão expostos a títulos atrelados ao IPCA ou CDI com spreads adicionais. Já os fundos de tijolo, mais sensíveis ao ciclo econômico, enfrentam desafios: inadimplência, renegociações e vacância podem pressionar seus rendimentos.
Gestão, carteira e histórico: os pilares da escolha
Independentemente da classe, o investidor deve observar atentamente:
- A composição da carteira
- O perfil dos locatários ou emissores
- O histórico de gestão em diferentes ciclos econômicos
Segundo o levantamento do Clube FII, o Ifix — índice que mede o desempenho dos principais FIIs — acumulou 133% nos últimos dez anos, contra 141% do Ibovespa e 121% do CDI (já descontado o IR). Os fundos de papel lideraram, com retorno de 165% no período.
Em janelas menores, a fotografia é distinta. Nos últimos cinco anos, o Ifix recuou 3%, impactado pela pandemia e pela desaceleração da economia física. No mesmo intervalo, os fundos de papel avançaram 34%, enquanto as lajes corporativas retraíram 29%.
O fator psicológico: como lidar com a volatilidade
Apesar da estabilidade dos rendimentos mensais, as cotas dos FIIs oscilam diariamente na bolsa. Essa volatilidade — muitas vezes descolada dos fundamentos — pode desconfortar investidores menos acostumados à renda variável.
O caso do HGLG11, fundo voltado a galpões logísticos, é ilustrativo: com dividendos estáveis em 12 meses, a cota recuou mais de 8%, mesmo com um dividend yield de 8,81%. Frente à possibilidade de obter CDI+ em outros ativos, o custo de oportunidade torna-se relevante.
“É fundamental que o investidor entenda o momento e não abandone o produto. Existem fundos com portfólios de alta qualidade sendo negociados com desconto”, aponta Danilo Barbosa, sócio do Clube FII.
Renda fixa isenta: o apelo das LCIs, LIGs e CRIs
Para perfis mais conservadores, os papéis de crédito imobiliário representam alternativas interessantes. Sua principal vantagem reside na isenção de imposto de renda — um diferencial competitivo frente a outros ativos de renda fixa.
Entretanto, é essencial comparar rentabilidades líquidas. Ângelo Belitardo Neto, da Hike Capital, recomenda uma conta simples:
Remuneração líquida = taxa da LCI ÷ (1 – alíquota de IR)
Exemplo: uma LCI com rendimento de 12,5% ao ano, diante de um IR de 22,5%, equivale a 16,2% bruto. Essa é a taxa real a ser comparada com CDBs, Tesouro Direto e outros títulos tributáveis.
Imóvel físico: para quem tem capital e tempo de gestão
A compra direta de imóveis pode ser interessante para quem já possui patrimônio consolidado e liquidez disponível. Segundo Felipe Laragnoit Leite, da Primaz, o ideal é um sinal de pelo menos 40% do valor do bem. Isso reduz o impacto do custo de oportunidade em relação ao CDI.
O retorno esperado gira em torno de 0,5% do valor do imóvel ao mês. No entanto, o investidor deve considerar:
- Comissão imobiliária
- Manutenção do bem
- Tributação sobre aluguéis superiores a R$ 2.112 mensais
Vitor Bidetti, da Integral BREI, sugere que essa modalidade seja considerada apenas por investidores com carteira já diversificada e patrimônio superior a R$ 1 milhão. “Trata-se de uma alocação conservadora, adequada para estratégias patrimoniais de longo prazo”, afirma.
Em resumo
Mesmo diante de uma Selic elevada, o setor imobiliário segue relevante para investidores que buscam diversificação, geração de renda e resiliência em horizontes prolongados. Conhecer o funcionamento de cada instrumento — dos FIIs aos papéis de crédito, passando pelo imóvel físico — é fundamental para uma alocação consciente e eficiente.